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Aramis

Cinema para ler - Para entender melhor o cinema de Eiseinstein

Há 5 anos, quando o seu cunhado, Luís Renato Ribas, começava a desenvolver o primeiro clube de vídeo no Paraná, o pintor Fernando Velloso, 55 anos, entusiasta por ver filmes estrangeiros em casa (detesta o cinema brasileiro e desde que o vídeo apareceu nunca mais colocou o pé num cinema comercial), conseguiu aquilo que, na época, era uma raridade: uma cópia pirata (por sua vez copiada de outra cópia), de péssima qualidade, de "O Encouraçado Potenkim", clássico do cinema mundial. Era uma raridade que pouquíssimos tinham. Quem imaginaria que o filme que ajudou a provocar a rebelião dos marinheiros em março de 1964 e foi "preso" pela Marinha durante 20 anos, seria colocado a disposição de quem quisesse? Mas foi! Hoje não só o "Potenkim", mas pelo menos três outras obras fundamentais de Eiseinstein - "A Greve", "Outubro" e "México" (obra póstuma que ele não pôde montar), estão no catálogo da Globo Vídeo. Curtido durante décadas apenas em cinematecas, para iniciados, a obra do mestre do cinema soviético, é hoje vista por quem se interessa em conhecer o que aconteceu de fundamental no cinema. Portanto, nada melhor do que conhecer também um pouco da vida e do pensamento do próprio Eiseinstein (Há muitos anos, a Zahar havia editado o "Reflexões de um Cineasta", obra naturalmente esgotada). Sensível para o público que busca cada vez mais informações sobre cinema, Luiz Schwartz inaugurou os lançamentos na área de cinema da Companhia das Letras com "Memórias Imorais - Uma Autobiografia", de Sergei M. Eiseinstein (Riga, Letônia, 23/01/1898 - Moscou, 11/12/1948), numa caprichadíssima edição (376 páginas, 98 ilustrações; capa de Guto Lucaz; tradução de Carlos Eugênio Marcondes de Moura). Num estilo fragmentário e assistemático, que faz lembrar os brilhantes efeitos de montagens de seus filmes, as "Memórias" de Eiseinstein, além de discutir, num tom de bate-papo informal, as concepções de cinema do autor, narram desde sua infância privilegiada, passando pela revolução - em que serviu no exército bolchevique como voluntário - até suas viagens pelo Ocidente e seus encontros com celebridades como André Malraux, Jean Cocteau, Paul Éluard ou James Joyce. Assim, ficamos sabendo, por exemplo, que Joyce, quase cego, pedia ao cineasta com "grande sinceridade", que lhe mostrasse seus filmes. Ou que Malraux, passeando com o autor pelas ruas de Paris, se gabava de ser capaz de citar de cor qualquer trecho de qualquer romance de seu conterrâneo Dostoievski. O livro contém, além disso, observações divertidas - sobre os costumes dos povos visitados. Mas nem tudo é um mar de rosas em "Memórias" (que na verdade, nada tem de imorais). Elas falam também de sua tentativa fracassada de fazer um filme no México - "Que Viva México!" (que só seria montado há poucos anos, por um de seus assistentes), da experiência também frustrada em Hollywood (sua intenção era filmar "Uma Tragédia Americana", de Theodore Dreiser, que, ironicamente, no ano de sua morte, 1948, foi levada à tela por George Stevens, com Liz Taylor, Montgomerry Cliff e Shelley Winters), dos duros anos da guerra e, especialmente, sua luta com a burocracia e a censura stalinista - que impediu a realização da terceira parte de "Ivan, o Terrível" (a Globo promete lançar em 1988, as duas primeiras partes deste clássico, assim como "Alexandre Neveski", outra de suas obras-primas). A edição no Brasil é um pouco diferente das traduções francesa e alemã, de responsabilidade de Herbert Marshall, ex-aluno de Eiseinstein em Moscou e atual diretor do Centro de Estudos Soviéticos e do Leste Europeu na Universidade de Souther Illinois. Além de um prefácio, há também apêndices esclarecedores de autoria do organizador.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Vídeo/Som
8
11/02/1988

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