As múltiplas faces de Lysimaco nos livros de dona Maria José
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 22 de setembro de 1989
Após ter publicado a mais talentosa biografia do engenheiro, professor e pedagogo Lysimaco Ferreira da Costa - "A Dimensão de um Homem" (Editora da Universidade Federal do Paraná, 1987, 612 páginas), sua filha, professora Maria José Franco Ferreira da Costa, está empenhada na preparação de mais dois volumes sobre a vida de seu pai. É que pela riqueza de detalhes e ampla documentação que dispõe - 238 pastas de documentos, arquivos, correspondência, publicações, etc., que ele, cuidadosamente, classificou num trabalho que se estendeu por dez anos - há informações que exigem mais dois livros.
A primeira parte focalizou das origens da família Ferreira da Costa - desde a chegada no Paraná, do avô paterno de Lysimaco, o também professor Antônio Ferreira da Costa Filho - chamado "Costa Velho", na primeira metade do século passado - até a atividade de Lysimaco como professor - das escolas públicas a Universidade do Paraná, da qual foi um dos fundadores. No volume que, atualmente prepara, dona Maria José vai revelar facetas até hoje pouco conhecidas do grande paranaense, especialmente de sua presença pela Secretaria da Fazenda no segundo governo Affonso Camargo, entre 1928/29, "num dos períodos mais difíceis que o Paraná já atravessou".
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Gravando um emotivo depoimento para o projeto Memória Histórica do Paraná, que vem sendo desenvolvido graças ao patrocínio do Bamerindus, a professora Maria José fez uma espécie de trailler do muito que tem para contar. "Só da passagem de papai pela Secretaria da Fazenda, no governo Affonso Camargo, possuo exatamente 27 pastas de documentos, mostrando o seu trabalho naqueles anos difíceis". Quando houve a revolução de 1930, dentro de sua lealdade e integridade, o professor Lysimaco - embora tivesse sido colega de Getúlio Vargas numa academia militar no interior do Rio Grande do Sul, na juventude - não aderiu ao movimento revolucionário, "pois pertencia a um governo legal", diz a sua filha. Enquanto Affonso Camargo e a maior parte de seu secretariado fugia de Curitiba, Lysimaco aqui permaneceu, justificando:
- "Tenho onze filhos e não vou abandonar a minha família".
Esteve preso por 60 dias e apesar de todas as investigações feitas em torno das finanças do governo Affonso Camargo, o próprio presidente da comissão de inquérito, Benjamin Lins (que foi o primeiro redator chefe da "Gazeta do Povo", fundada em 1919 e que fazia oposição a Camargo) reconheceu a honestidade de Lysimaco, sobre a qual nunca foi provada a menor acusação.
- "Quando papai morreu, o próprio Benjamin Lins veio para nos dizer de sua admiração por ele".
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Lysimaco Ferreira da Costa (1884-1941) e sua esposa, Esther Franco da Costa (1886-1920) tiveram onze filhos. Embora formado em Engenharia Geológica (1915) e Civil (1917) pela Universidade do Paraná - "foi o primeiro engenheiro a receber o diploma, das mãos de Nilo Cairo", diz dona Maria José - o nome de Lysimaco está, basicamente, ligado ao ensino. Professor do segundo grau, quando entrou na Universidade, em 1912, logo teria uma condição única: ao mesmo tempo que era estudante de Engenharia, lecionava Física e Química, matérias que já vinha ensinando há anos, no Gymnasium Paranaense.
Professor do Gymnasium Paranaense até sua morte - diretor daquele estabelecimento-modelo por oito anos, foi também professor e diretor do Instituto de Educação do Paraná, pelo qual se formaram suas cinco filhas. Três de seus filhos - Lysimaco, Plínio (que chegou a vice-governador, na administração Paulo Pimentel e dirigiu o DER por vários anos) e Alberto, formaram-se em Engenharia. Antônio, o mais velho, formou-se em Direito, e fez carreira na magistratura, tendo sido o presidente que por maior período presidiu o Tribunal de Justiça do Paraná. Dois de seus filhos formaram-se em Medicina - Evaristo, que se dedicou com tal destemor a tisiologia, que contraiu doenças que provocariam sua morte, e Carlos, médico e professor, é um dos mais conceituados especialistas do Paraná. As filhas formaram-se pelo Instituto de Educação - Zoê, Laura (já falecida), Maria José e Maria Josefina. Dona Maria José, a partir de 1945, por concurso, foi nomeada inspetora do ensino no Paraná, função que desempenhou até 1977, quando, aposentando-se, passou a se dedicar a preparar a ampla biografia de seu pai, que agora dá seqüência trabalhando no segundo volume. Herbert Van Erven, historiador paranaense, há 40 anos, foi o primeiro a publicar um livro (edição Guaíra) sobre Lysimaco, mostrando sua importância dentro do ensino no Paraná.
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Extremamente diplomática em não ferir susceptibilidades - "meu pai sempre nos ensinou a jamais cultivar inimizades e perdoar os que nos prejudicavam" - dona Maria José mostra-se cautelosa ao examinar os fatos ligados ao governo Affonso Camargo. Já com relação a pública desavença entre Lysimaco e o professor Dario Velloso, revela que o rompimento ocorreu numa reunião de uma loja maçônica, na qual ambos pertenciam. Lysimaco discordou de uma manifestação anti-religiosa que os maçons pretendiam fazer e, a partir de então, por mais de 20 anos, não teve relações com Dario Velloso, apesar de ambos serem colegas no Gymnasium Paranaense. "No final de sua vida, Dario veio a nossa casa e reconciliou-se com papai. Acredito mesmo que foi por influência dos filhos de Dario, que muito admiravam papai, que Dario não quis morrer sem esta reconciliação", diz dona Maria José.
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Na paradisíaca casa em que nasceu, viveu e morreu Lysimaco, rodeada de seus livros, entre preciosas pinturas - como um óleo de Andersen, mostrando o desabitado "Campo do Paraná" (local no qual hoje é o Centro Cívico), com sua vivência de 66 anos, a professora Maria José lembra de uma Curitiba tranqüila - totalmente diversa da agitação de nossos dias. E nesta cidade, com sua privilegiada memória e amparada na ampla documentação criteriosamente organizada, está compondo o grande painel mostrando a presença de Lysimaco Ferreira da Costa, em suas várias dimensões. Na terceira parte da biografia dona Maria José vai detalhar a participação dele como engenheiro e geólogo na elaboração do Plano Siderúrgico Nacional, suas pesquisas e tentativas para que a primeira grande siderúrgica fosse instalada no Paraná, "o que quase obteve".
"Só que Getúlio (Vargas) preferiu Volta Redonda, já que seu genro, Amaral Peixoto, era o governador do Estado do Rio", comenta, acrescentando uma revelação - entre as muitas que tem para fazer em seu livro.
- "Só que foi papai o primeiro engenheiro a ser convidado para presidir a Companhia Siderúrgica Nacional. Infelizmente, o convite chegou uma semana antes de sua morte".
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