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Aramis

Hoje, a premiação dos melhores do II FestRio

RIO DE JANEIRO - Muitos espectadores menos atentos nem chegaram a reconhecer naquele senhor envelhecido, cabeleira branca - "uma versão mais gorda o escritor Ignácio de Loyola" como disse, o poeta e cronista Affonso Romano Sant'Anna - o ator Gian Maria Volonte. Sentindo-se meio doente ao chegar ao Rio, o astro de "O Caso Matte" e tantos outros políticos filmes italianos, era um dos poucos membros do júri oficial que preferia assistir aos filmes em competição na platéia central. Mas nos intervalos, cansado, ficava numa das poucas cadeiras existentes no hall - atencioso mas reservado com as pessoas que o procuravam. A atriz Norma Bengell, representando os artistas brasileiros no júri, também preferia democraticamente a platéia, assim como a atriz francesa Bernadete Lafonte - diferente da imagem juvenil dos anos 60, quando estrelava filmes de Charrol e Truffaut. "Agora é uma respeitável senhora", comenta sua amiga, Norma Bengell. O cineasta Miguel Littin, chileno exilado e que foi notícia de destaque durante o FestRio por sua ousadia em voltar ao Chile, disfarçado para rodar um filme e o húngaro Istvan Szabo, foram os diretores importantes presentes no festival - ambos também integrando o júri. A atriz Ellen Burstyn poucos viram: ficou sempre no camarote do júri, no andar superior à Sala Glauber Rocha, onde eram [projetados] os filmes em competição. Sem grandes estrelas e, infelizmente, sem filmes que provocassem maiores sensações - ao contrário, trazendo frustração entre público e imprensa - esta segunda edição do Festival Internacional de Cinema, Vídeo e Televisão chega hoje ao seu final. Ao contrário do ano passado, quando após a projeção de "Cabra Marcado para Morrer", o filme de Eduardo Coutinho [passou] a ser, imediatamente, cotado como o grande vencedor, este ano, até a noite de quinta-feira e faltando apenas três filmes a serem exibidos (o indiano "Trikaal", de Shyan Benegal; o cubano "En Tres y Dos", de Roland Diaz, e o italiano "Cosi Parlo Bellavista", de Luciano de Crescenzo, mostrados ontem), era difícil obter indicações de prováveis vencedores. Além da premiação oficial do chamado grande júri - presidido pelo produtor Luís Carlos Barreto; há seis outros júris específicos: o que escolherá os melhores vídeos em competição; o que apontará o melhor curta-metragem e os que darão premiações específicas - OCIC (Office Catholique International du Cinea), para a obra de maior mensagem e sentido humano; o Cifej (Centro International du Film Pour L'Enfance et Le jeunesse); o da Fipresci (Federation International de La Presse Cinematographique); o da FICC (Federacion Internacionale des Cine-Clubes); que dará o Troféu Dom Quixote. Assim, ao lado do "Tucano de Ouro" - a grande premiação, uma dezena de outros troféus estarão contemplando os melhores entre os 22 filmes exibidos nesta maratona cinematográfica iniciada há 10 dias. CRISE DE CRIAÇÃO Houve cerca de 150 filmes inscritos por dezenas de países para a seleção dos 22 filmes em competição. Assim é de se estranhar que obras medíocres e menores - como o espanhol "Se infel no mires conquien", representando a Espanha, tivessem chegado a esta mostra. Não houve, na verdade, nenhuma fita que provocasse maiores entusiasmos e, ao menos nas sessões matinais para a imprensa, os aplausos foram mínimos - chegando-se às vaias para o decepcionante "Target", de Arthur Penn - aguardado como a grande esperança. Nas sessões da noite, para o grande público, os aplausos foram mais generosos, mas assim mesmo sem a emoção que, por exemplo, no ano passado caracterizou "1984" (que agora está em exibição em Curitiba, Cine Itália) e "Cabra Marcado para Morrer". Pelo regulamento que seguem os festivais internacionais de primeira categoria (nos quais se inclui o FestRio) - somente filmes inéditos, ou seja, aqueles que não tenham sido apresentados em outros festivais, podem concorrer. Com isto, cada país é obrigado a ser representado pelos filmes mais novos, concluídos há pouco ou que não tenham tido, anteriormente, participado de festivais. A Argentina, que vem se destacando com um novo e profundo cinema, acumulou premiações internacionais com "Camila" e "A História Oficial", mas que aqui só chegaram para as mostras paralelas. Em compensação, o representante argentino foi o teatral "Esperando la carroza", de Alejandro Doria, baseado numa peça de sucesso em Buenos Aires. Dois filmes com toques humanos, suaves e sinceros, capazes de receber alguma premiação: o russo "Como éramos jovens" (Kak Molody My Byli), de Mikjai Belkov, com ação nos anos 50, às vésperas das primeiras conquistas espaciais e "Um adeus português", do ex-cineclubista João Botelho, com a ação desenvolvida em dois planos - na África, em 1972 e em Portugal, em 1984. Drama familiar sobre conflitos de uma filha adolescente com o seu pai, um policial violento e solitário, "No interior de uma baleia" (In innern des Wals), representando a Alemanha Ocidental, revela uma nova diretora, Doris Dorrie, e também novos intérpretes: Janna Marangosaff, Eise Gulp, Silvia Reize etc., Já o cinema brasileiro teve três concorrentes: o favorito "Brás Cubas", de Julio Bressane - um dos poucos filmes a apresentar uma linguagem não convencional, mas por isso mesmo hermético em termos de público e praticamente liqüefazendo a história de Machado de Assis; o documentário "Céu Aberto", de João Batista Andrade [e] "Tigípio", de Pedro Jorge de Castro. Produção modesta rodada no interior do Ceará, "Tigípio" (o nome vem de uma fruta nordestina, de bom sabor mas perigosa se comida em excesso), tem uma linguagem clara e sua ação se passa durante a seca entre 1915-1919. José Dumont, o ator nordestino mais premiado dos últimos anos ("O home que virou suco", "O baiano fantasma" etc), interpreta um administrador de uma pedreira - única fonte de emprego na perdida cidade do interior cearense, no qual admite como feitor um coronel falido pela seca (boa interpretação do diretor e ator teatral cearense B. de Paiva), interessado em sua filha (a bela e talentosa Regina Dourado), que acaba engravidando. Um final dramático, bem ao gosto das tragédias nordestinas. O roteiro teve por base um conto de Herman de Lima e a trilha sonora é interessante, com temas do compositor cearense Ednardo, que ficou famoso, anos atrás, pelo seu tema do "Pavão Misterioso", popularizado na telenovela "Saramandaia". LEGENDA : Tancredo Neves, numa cena de arquivo, em "A Céu Aberto", e o político filme de João Batista de Andrade.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
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Tablóide
30/11/1985

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