Login do usuário

Aramis

Muita política no novo cineclubismo

Dentro das intensas atividades cinematográficas que movimentarão Curitiba a partir de hoje, com a realização do Fórum do Cinema Documentário, encontro de dezenas de documentaristas para discussão de problemas de produção e distribuição dos curtas-metragens e exibição de importantíssimos filmes deste gênero, haverá também muito debate político. Mas a questão vai esquentar, mesmo, no final da próxima semana, quando na Cinemateca do Museu Guido Viaro estará acontecendo o I Encontro de Cineclubes da Região Sul. Mais do que a discussão de problemas ligados ao cinema, o encontro de meia centena de ativos dirigentes de cineclubes de três Estados - uma dezena dos quais do Paraná - tratará de costurar uma frente ampla, unindo partidários do PMDB, PT e anarquistas contra os organizados integrantes do Partido Comunista que, em 1984, com a diferença de apenas dois votos, conseguiram a direção do Conselho Nacional de Cineclubes. Este ano, a próxima Jornada dos Cineclubistas acontecerá em Brasília, dentro de dois meses e o coordenador da Federação dos Cine-Clubes do Paraná, José Gil de Almeida, 29 anos, é o mais forte candidato ao cargo. xxx De um amortecido movimento cultural, com origens ainda nos anos 30, quando fundou-se no Rio de Janeiro o histórico "Chaplin Clube", o cineclubismo revigorou-se nos últimos anos, especialmente com a redemocratização do País. Deixando a visão elitista de projetar apenas filmes de arte para discussões estético-cinematográficas, os cineclubistas passaram a ocupar um espaço junto a entidades operárias, estudantis e, especialmente grupos políticos, fazendo circular filmes - entre longas e curta-metragens - que normalmente não encontram outros canais para serem mostrados. Por exemplo, em Maringá - cidade com uma forte colônia árabe, na qual o prefeito (Said Ferreira), procurador, juiz de Direito e delegado de Polícia, são descendentes diretos de árabes, coube ao Cine Clube, presidido por José Gil de Almeida, promover uma série de ciclos cinematográficos de países árabes, prestigiados inclusive pela presença de embaixadores e adidos culturais de vários países. Em Goioerê, cidade natal de Gil, também há um ativo cineclube, que tem levado filmes sobre questões agrárias, já tendo sofrido problemas políticos. Outras vezes há intolerância de autoridades, como no caso de professores que devido a uma visão limitada do que seja cinema tentaram suspender um ciclo do cinema paranaense que apresentava o filme "Maldita Coincidência", primeiro longa-metragem de Sérgio Bianchi. xxx Em Curitiba, onde até há 3 anos passados não existia nenhum cineclube atuante, agora a situação inverteu-se. No Diretório Acadêmico Nilo Cairo há um atuante cineclube preocupado em mostrar filmes políticos e no Diretório Central dos Estudantes também acontecem sucessivas sessões. Há algumas semanas, em sessões contínuas, foi projetado, em tape, uma cópia, dublada em italiano e com legendas em português, de "Je Vous Salue, Marie", de Jean-Luc Godard - que embora esteja oficialmente proibida no Brasil, tem centenas de cópias piratas em distribuição nacional - numa desobediência civil à injusta proibição do governo deste belo filme. Se o Cine Clube Aníbal Requião, que funciona junto ao cine Morgenau, dirigido por Jorge Santos preocupa-se exclusivamente com reprises de westerns e filmes românticos dos anos 30 a 50, para uma platéia de velhos cinemaníacos, há dois cineclubes com uma visão totalmente oposta. Um deles é o Cine Clube Vídeo Sindicato do Delírio, dirigido pelo punk Gallo (Edson Vulcanis), que mostra apenas filmes e, especialmente, tapes de bandas de heavy rock, punk e, agora, Dark. Já o recém-fundado cineclube Palestina, Voltaremos, dirigido pela jovem Regina Al Massari, pretende realizar um trabalho local semelhante ao que foi feito em Maringá: difundir o cinema árabe, desconhecido nos circuitos comerciais no Brasil e que trazem, naturalmente, inflamadas informações e mensagens políticas. Há também cineclubes organizados atuando em Jacarezinho, Ponta Grossa, Maringá, Cascavel, Foz do Iguaçu e Mandaguari - afora Maringá e Goioerê. Um movimento intenso, que tem no jornal "Opção Cultural" sua publicação oficial e que se estrutura de forma a representar uma resistência alternativa ao cinema comercial - aberto a todas as tendências políticas. Em Curitiba, há ainda outros cineclubes fundados há pouco: um da Associação dos Funcionários Municipais, presidido por Caca Velasques, e o do Colégio Medianeira, dirigido pelo estudante Aleksei Wrobel. xxx Embora as discussões e mesas redondas devam ocupar os cineclubistas que estarão reunidos em Curitiba, nos dias 30 e 31 de abril, haverá também projeções de filmes e vídeos políticos, especialmente sobre movimentos existentes na América Latina. Como homenageada especial do encontro aqui estará uma jovem líder da resistência anti-Stroessner, em Assunção, Diana Banvelos Melim, presidenta da Juventude Revolucionária Febrerista do Paraguai. O cinema paraguaio, infelizmente, ainda não tem um filme de expressão revolucionária, mas a presença da atuante Diana, de viva voz, deverá suprir a ausência das imagens pela força das palavras.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
2
25/05/1986

Enviar novo comentário

O conteúdo deste campo é privado não será exibido publicamente.
CAPTCHA
Esta questão é para verificar se você é um humano e para prevenir dos spams automáticos.
Image CAPTCHA
Digite os caracteres que aparecem na imagem.
© 1996-2016. tabloide digital - 35 anos de jornalismo sob a ótica de Aramis Millarch - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Altermedia.com.br