Quando a música serve a política
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 11 de junho de 1989
No início do governo Paulo Pimentel, quando o advogado Gabriel Baron, já falecido, assumiu a direção do antigo Departamento Estadual de Compras, surpreendeu-se ao encontrar nos depósitos daquele órgão, algumas dezenas de gravações musicais, contendo mensagens políticas. Saldo de administrações passadas, ficaram ganhando pó e acabaram ali perdidas.
Num levantamento do som na vida brasileira, adquirem especial significado as gravações feitas para campanhas políticas. Mesmo os mais medíocres jingles produzidos a toque de caixa acabam se tornando peças históricas e é uma pena que até hoje os museus da Imagem e do Som não tenham se preocupado em solicitar aos partidos (e candidatos), passada a euforia das campanhas, cópias de suas mensagens musicais. Por certo enriqueceriam seus acervos.
O pesquisador Luciano Lacerda (1920-1987) era um incansável colecionar de discos (e fitas) com jingles, discursos e mensagens políticas. Brasil afora, milhares de candidatos tiveram suas mensagem traduzidas em jingles e músicas (além de mensagens gravadas) em registros que, infelizmente, se perderam.
A idéia de produzir o álbum "O Grande Presidente" para arrecadar fundos para a campanha de Brizola não é nova. Há 31 anos, quando disputava sua reeleição à Câmara Federal, Carlos Lacerda (1914-1977) transformou os discursos de improviso que fazia sobre um caminhão, percorrendo as ruas do Rio de Janeiro, no elepê "O Caminhão do Povo". Com introdução de Raul Brunini, 70 anos, ex-radialista e político (vereador, deputado estadual e federal) e a participação de Afonso Arinos, hoje aos 84 anos, senador, os incandescentes discursos que Lacerda fazia em 1958, "no caminhão alugado no qual percorremos as ruas do Rio para falar ao povo", estão num disco. Na época, proibido de falar no rádio e na incipiente televisão, Lacerda recorreu à gravação de um disco para colocar sua mensagem. Aproveitou o lado dois para incluir trechos do discurso de 10 horas, pronunciado em maio de 1957, na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, "quando o povo defendeu o meu mandato, ameaçado pela traição e pela violência, um discurso que nunca foi irradiado". No final do texto que escreveu para a contracapa de "O Caminhão do Povo", Lacerda dizia: "Está protegido pela lei - que assegura o direito de manifestar opiniões sem censura e assim este disco pode ser tocado em qualquer parte. Esperamos que ele seja, nas suas mãos, entre tantas razões para descrever [descrer] e desanimar, um instrumento de educação cívica e uma voz de esperança e de fé".
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