Um filme é um filme. Um livro é um livro
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 12 de junho de 1987
O próprio Umberto Eco declarou: "Um livro e um filme são objetos diferentes, de autores diferentes, e é bom que cada um deles tenha sua própria vida". Portanto, estupidez dos "intelectualizados" leitores de "O Nome da Rosa" em querer minimizar o filme de Jean-Jacques Annaud ("Preto e Branco em Cores", "A Guerra do Fogo" e o inédito no Brasil, "Oup do Tète") com comparações, "é apenas um filme policial na Idade Média" ou "o livro é melhor". Pode até ser, mas o filme é excelente e, em lançamento nacional atinge um público que não leu o livro (ou não passou de suas primeiras 100 páginas).
Excluindo-se o livro - que voltará agora a ser procurado - o filme confirma o talento de Annaud, 44 anos, francês de Jivsy-sur-Orge, que apesar de ter o seu "Preto e Branco em Cores" premiado com o Oscar de melhor filme estrangeiro, há dez anos, só consegue fazer cinema de tempos em tempos - e ganha a vida dirigindo filmes publicitários.
A produção de "O Nome da Rosa" arrastou-se por quase 3 anos, enquanto o livro do semiólogo Umberto Eco escalava as listas de best-seller em todos os países onde foi editado. O resultado, em termos de cinema, é ótimo: o roteiro é conciso, a trama bem aramada e - o que á mais importante - consegue-se de uma história ambientada há quase 7 séculos obter-se contemporaneidade: a intolerância, a censura, a vileza, a perseguição às idéias. O filme tem múltiplas óticas de interpretações, que justifica o generoso espaço que vem ganhando na imprensa há mais de seis meses, desde que entrou na Europa. Um dos aspectos importantes - lembrado dia 28 de maio último, pelo arguto Luís Fernando Emediato ("O Estado de São Paulo"), foi a busca que Annaud fez em Fellini, Pasolini, Brueghel, Bosch e Caravaggio para compor os personagens dos filmes: gordos, glutões, debilóides, repressores, envolvidos em picuinhas sutis irreverentes. O filme é fascinante em muitos aspectos, traz Sean Connery no melhor papel de sua carreira - ironicamente como um detetive da Idade Média em trajes franciscanos - sem o direito de matar "mas não morrer" como o personagem de Ian Fleming que o lançou nas telas há quase 30 anos - mas com a sutileza de outro inglês, o imortal personagem criado por Sir Arthur Conan Doyle, reverenciado até no nome do personagem (William de Baskerville, que nos remete ao famoso livro).
"O Nome da Rosa" é um filme fascinante. Não perca!
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