A notícia e as suas diversas implicações
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 06 de julho de 1986
Não há mais motivo para queixas. A bibliografia sobre comunicação em língua portuguesa já é expressiva. Se, naturalmente, ainda não chegamos a diversificação que oferecem as bibliotecas especializadas em inglês ou francês, já temos um bom número de ensaios, estudos, propostas, teses etc, sobre as várias áreas da comunicação. E com um detalhe: muitos autores brasileiros escrevendo sobre a nossa realidade em termos de comunicação.
A Summus, na coleção "Novas Formas de Comunicação", já lançou mais de 10 títulos dos mais expressivos. A Ática, que tem uma excelente série de ensaios também tem dado importância a esta área e ainda agora publica "O Capital da Notícia - Jornalismo como produção Social da Segunda Natureza" de Ciro Marcondes Filho (188 páginas, volume 121 da coleção "Ensaios").
Professor adjunto da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, mestre também no programa de pós-graduação em Comunicação Social do Instituto metodista de Ensino de São Bernardo do Campo, SP, Ciro Marcondes Filho aborda aspectos relevantes para o jornalismo atual - a transformação da atividade jornalística em grande empresa capitalista, a situação do jornalismo sob o Estado liberal e em alguns casos concretos, como sob o fascismo, sob Alvarado no Peru, e durante a Revolução dos Cravos, em Portugal "fica difícil destacar um ponto em detrimento de outros" - como observa Maurício Tragtenberg no lúcido prefácio. Maurício, aliás, lembra também que Ciro busca analisar as características do Estado Moderno na época atual, que se convencionou definir como época do "capitalismo tardio" ou do "capitalismo monopolista". Assim, para Marcondes Filho, o Estado na época atual é o grande organizador da hegemonia, no sentido gramasciano do termo, controlando, através de licenças, os instrumentos de reprodução simbólica. Desativando a política e eliminando a opinião pública com capacidade de opor-se, a ele, através da comunicação de massa, reforça o controle social. Ou seja, sob uma fachada democrática, o Estado no século XX realiza a "democracia totalitária" enunciada por Tocqueville no século passado.
Original e penetrante é também a análise da questão de transformação de fatos em notícias e destas em mercadorias. O primeiro momento assinalado é aquele em que a ideologia penetra na comunicação; o segundo momento é aquele em que a notícia como mercadoria cultiva a passividade e despolitização social.
Como se vê, as propostas discutidas por Ciro Marcondes Filho em "O Capital da Notícia" são profundas e abrangentes. Um livro atual, indispensável não apenas aos que fazem notícias - mas aos que consomem a notícia. ou seja, todos os leitores.
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